A CONSCIÊNCIA COM TPM........
(texto de Mauro Pereira.....)
"Eu e minha consciência sempre tivemos um relacionamento um tanto quanto conturbado.
Dia desses eu a surpreendi tristonha e com os olhos marejados. Preocupado, mas imprudente, perguntei:
“Por quem choras, velha amiga?”.
A resposta doeu mais do que pedra no rim:
“Choro por ti, argentino enrustido! E velha é a avó dos seus filhos!”.
Era evidente seu estado de espírito belicoso.
Porém, eu estava decidido a fazer as pazes com a aquela senhora vetusta com ares de quem sabe tudo e determinada em ser a dona das minhas vontades.
Fiz-me de desentendido à provocação nacionalista, mas a ofensa à minha santa mãezinha está entalada na minha goela até agora.
Não faltará oportunidade para eu dar o troco.
Irredutível, e de dedo em riste, vive pegando no meu pé me acusando de ser radical demais com o governo petista.
“É muito fácil ficar o dia todo, todos os dias, com o traseiro grudado em uma cadeira na frente de um computador a procurar defeitos da administração federal”, inquiriu.
“Dispa-se desse virtuosismo paraguaio.
Se permita ser humilde pelo menos uma vez nessa sua vidinha deprimente e conceda à Dilma a chance que você nunca concedeu ao Lula.
Com certeza algo de bom você haverá de encontrar, afinal são quase onze anos no poder e, por mais que se esforce, nem mesmo o PT consegue ser ruim o tempo todo.
E, depois, não custa nada tentar, além do mais você poderá se beneficiar dos efeitos balsâmicos da paz dos justos, reservada apenas às almas desprovidas de sentimentos inferiores como o ódio e o preconceito”.
“Ufa!, essa mala sem alça fala pelos cotovelos!”, esbravejei.
Embora estivesse imbuído da mais pacífica das intenções, eu não iria deixar sem resposta uma acusação daquela gravidade.
“Pera aí, nega. Devagar com o andor! Eu não sinto ódio e não sou, nem nunca fui, preconceituoso”, respondi.
Tirando do armário sua mofada fantasia de síndica de bordel chinês, filosofou, sem dó: “Todo aquele que se diz sem preconceitos traz na alma gravado a ferro e fogo o estigma dos preconceituosos”.
Aquela matraca incessante estava conseguindo me irritar e eu já analisava com carinho a possibilidade de enchê-la de porrada. “Se ela me chamar de gafanhoto eu saio no braço. É melhor não”, refleti.
Não descartei a possibilidade de ela procurar guarida no colo protetor de uma certa Maria da Penha.
Para piorar a situação, o fofoqueiro do meu sexto sentido resolveu entrar na conversa sem ser chamado e cochichou no meu ouvido:
“Não sei não, mas acho que sua consciência tem uma quedazinha pelo PT!”. “Blasfêmia!”, retruquei indignado e, incontinenti, o coloquei no seu devido lugar....
Segura de que estava por cima da carne seca, armou-se de sua melhor cara de safada e propôs: “Que tal, então, fazermos um quiz? O nenê topa?”.
Aquilo era demais e não me contive reagindo prontamente ao assédio: “Fazer o quê?, sua pervertida, a senhora me respeite!”. Conciliadora e magnânima, ela explicou:
“Calma, tolinho, você não sabe o significado do vocábulo quiz? É só um jogo sem graça de perguntas e respostas rápidas. Eu pergunto sobre as realizações do governo petista e você responde, se for capaz. Vai afinar?”, zombou, desafiadora.
Confesso que vi minha viola em caco, pois, na verdade, eu não sabia sequer o significado do vocábulo vocábulo. Mas eu não ia correr da raia e dar o gosto da vitória àquela metida. Não sem resistir.
À beira do desespero, apelei feio e recorri à sabedoria salomônica dos meus botões: “Agora não é hora de dar uma de frouxo, né meu?”, sentenciou o mais experiente deles.
“Não desanimeis, mostre a essa presunçosa o que sempre foste. Não se subestime, és, entre todos, o maior dos filhos da luta”. Mais aliviado e procurando esconder a paura que tomava conta de todo o meu ser, estufei o peito e grunhi com o meu último fio de voz:
“Prega fogo. Seja o que Deus quiser!”.
Sorriu o sorriso do escárnio e decretou: “Vamos lá, então”.
- Fome Zero?
- Morreu de fome.
- O PAC?
- Empacou.
- Transposição do Rio São Francisco?
- É obra do PAC.
- Bolsa Família?
- É um bolsão.
- Minha Casa, Minha Vida?
- Minha Causa, Sua Dívida.
- Mensalão?
- Não sei de nada!
- Honestidade?
- Seu nome é Zé Dirceu.
- E a Copa?
- Pergunte pro Capo.
- A Dilma?
- Nascida para dirigir moto.
- O pior dos males?
- Intelectual autodidata.
- O Lula?
- Intelectual autodidata...
Nessa altura do campeonato eu estava nas nuvens, pois era evidente a raiva estampada no seu semblante sempre sereno esbanjando auto-confiança. A espuma que escorria pelos cantos de sua boca prenunciava o início do fim.
“Ok, entrego os pontos, você venceu! Essa tranqueira desse PT me fez pagar o maior mico. Quer saber de uma coisa, pau nele!”. Seu sangue italiano clamava por vendeta. À moda siciliana.
Compadecido com o seu estado lastimável, procurei alguma forma de reconfortá-la e contemporizei: “Que isso, companheira de jornadas memoráveis, não se deixe abater. Tem o projeto do Trem Bala!”. Imediatamente vi renascer o brilho naqueles olhos opacos.
Tomada por uma euforia repentina, exultou: “É isso aí, como que eu pude esquecer? O Trem-Bala é, sem a menor sombra de dúvida, a cereja do bolo. Iniciativa corajosa e futurista, que demonstra a envergadura de um estadista feito o Lula e dá a dimensão exata do seu projeto de governo!”.
Subitamente calou-se. Talvez arrependida de sua última frase, quem sabe. Ao som do silêncio dos espertos, decretou o fim daquele diálogo insano. Também me dei por satisfeito e dispensando o uso de palavras inúteis, selamos nosso pacto de paz.
Entretanto, sabíamos, ela e eu, que aquela trégua tinha a mesma credibilidade dos doutorados de Lula e da castidade de Rosemary.
Era só uma questão de dias para algum celerado do governo cometer outra falcatrua e reacender as brasas mal apagadas daquela fogueira de vaidades. Mas até lá, haveríamos de conviver de acordo com os ditames da civilidade.
Numa boa....."